Idealizada por Aysha Nascimento, Bruno Garcia e Flávio Rodrigues, montagem propõe um reencontro do público, sob a perspectiva bantu cíclico-espiralar, com imagens de uma das soberanas mais estudadas no mundo
Ao resgatar a relação entre a rainha Nzinga e seu irmão Ngola Mbandi, do Ndongo (parte do atual território de Angola), o espetáculo teatral Nzinga propõe um mergulho nos repertórios culturais das matrizes bantu. O trabalho, idealizado por Aysha Nascimento, Bruno Garcia e Flávio Rodrigues, está em cartaz no Sesc Pompeia – Sala Experimental até 5 de agosto, com apresentações de terça a sexta, às 20h30. Em cena estão Aysha Nascimento e Flávio Rodrigues.
Com dramaturgia de Dione Carlos, a trama parte de um recorte temporal de sete anos, entre 1617 e 1624, desde o momento em que Ngola Mbandi assume o trono após a morte do pai até a coroação de Nzinga como soberana do Ndongo, após o falecimento de seu irmão. A ideia da montagem é debater fragmentos desta narrativa a partir de uma visão afrodiaspórica, negando o pensamento eurocentrado que supõe que a história das populações negro-africanas se inicia com o processo de escravização mercantilista e se encerra com a colonização.
Também conhecida como Njinga a Mbandi, Jinga, Ginga, Ana Nzinga, Ngola Nzinga, Nzinga de Matamba, Mbande Ana Nzinga e Dona Ana de Sousa, a rainha angolana configura-se enquanto ente-personagem mítica e sócio-histórica que reitera as resistências dos povos africanos e permite aos afrodescendentes acessar e recontar suas próprias histórias, repletas de possibilidades imprevisíveis.
“Essa história viabilizou um mergulho nos repertórios culturais das matrizes bantu, modelos civilizacionais baseados na ética comunitária e no vitalismo, em uma concepção de existência integrada. O espetáculo traz premissas que podem, creio eu, fortalecer nossos lugares de potência, sobretudo diante do momento atual de tantas mazelas. O espetáculo é uma proposta, e não uma resposta, sobre ser, estar e sentir no mundo”, revela Aysha Nascimento, co-idealizadora do trabalho.
Ela ainda conta que teve um maior contato com a história da rainha Nzinga em 2017, quando ela e Flávio Rodrigue apresentaram junto com o Coletivo Negro o espetáculo Revolver no FESTECA – Festival Internacional de Teatro do Cazenga, província de Luanda, Angola.
“Infelizmente, pouco se sabe sobre os irmãos e irmãs de Mwene Nzinga, então nós nos apoiamos em fontes bibliográficas combinadas a fontes orais de uma produção panafricanista muito específica. O nosso objetivo era escapar da construção antagônica entre os irmãos sustentada pelas fontes eurocêntricas”, explica a atriz.
A partir da perspectiva bantu, o espetáculo propõe ao público uma reflexão sobre a ética comunitária, as relações de gênero, a irmandade, as concepções de espaço-tempo, as noções de família, as lógicas de poder e as táticas anticoloniais.
“À medida que fomos estudando as filosofias das matrizes ‘congo-angolanas’, pudemos refletir sobre temas importantes, como família alargada e relações de poder ou gestão do poder sob outro ponto de vista, bem distinto da concepção ocidental. Esperamos que, por meio de outras experiências, a gente possa conceber o mundo e apreender a realidade de outras formas. Por isso, lançamos luz a tais repertórios e referenciais reatualizados a partir da nossa experiência afrodiaspórica”, relata Flávio Rodrigues, co-idealizador do trabalho e ator que divide a cena com Aysha Nascimento.
Ainda sobre esse rico processo, o historiador Bruno Garcia, co-idealizador e orientador de pesquisa teórica do trabalho, acrescenta: “Iniciamos nossos estudos lendo autoras e autores da região de África Central (sobretudo, da República Democrática do Congo|RDC e de Angola), na tentativa de compreender as concepções de tempo, espaço e pessoa pelo prisma dos Bakongo, dos Mbundu e dos Tchokwe. Dentre nossos referenciais, podemos citar a produção do congolês Bunseki Fu-Kiau e do angolano Patrício Batsîkama. Contamos também com a parceria da sua majestade, a rainha Diambi Kabatusuila (RDC), do pesquisador soteropolitano Niyi Tokunbo Mon’a-Nzambi, do historiador angolano Filipe A. Vidal, da cientista política e estilista angolana Cristina Lucas Magalhães, do historiador panafricanista angolano Luís Miguel Antônio Dias e do historiador e artista mineiro Salloma Salomão. Essas parcerias nos permitiram aprofundar nossas conexões África-Brasil pelo Atlântico Negro”.
Ficha técnica
Idealização, concepção e direção geral: Aysha Nascimento, Bruno Garcia e Flávio Rodrigues. Atuação: Aysha Nascimento e Flávio Rodrigues. Orientação artística: Eduardo Okamoto. Orientação artístico-pedagógica (fase inicial): Maria Thaís Direção musical: Salloma Salomão. Trilha sonora original: Salloma Salomão e Gui Braz (Aruanda Mundi). Vozes gravadas: Salloma Salomão e Juçara Marçal. Musicistas:Aysha Nascimento, Flávio Rodrigues, Gui Braz, Salloma Salomão, Jéssica Areias, Manoel Trindade e Érica Navarro. Dramaturgia: Dione Carlos. Preparação corporal: Val Ribeiro. Preparação corporal (fase inicial):Kanzelumuka. Orientação de pesquisa teórica: Bruno Garcia. Desenho de luz: Wagner Pinto. Cenografia: Julio Dojcsar. Figurino: Silvana Marcondes. Costureira: Judite de Lima. Joias: Débora Marçal (Preta Rainha). Técnico de luz: Gabriel Greghi. Operadora de luz: Beatriz Nauali. Técnico e operador de som: Jo Coutinho. Assistente de palco: Robson Toma. Registro audiovisual processual: Edson Santos. Produção administrativa: Janaína Grasso (MALIK – Esporte e Cultura LTDA). Produção executiva: Izah Neiva. Fotografia: Sérgio Fernandes. Assessoria de imprensa: Adriana Balsanelli. Ilustração: Yirenkyi Asante. Realização: Diásporas Produções; Produtora Malik; ProAC – Edital ProAC Expresso Nº 01/2020 – Programa De Ação Cultural – “Produção e temporada de espetáculos inéditos de Teatro no Estado de São Paulo”; e Sesc Pompeia.
Serviço:
NZINGA
Temporada: até 5 de agosto de 2022
Horário: terça a sexta às 20h30
Local: Sesc Pompeia, Rua Clélia, 93, Água Branca, São Paulo, SP
Duração: 60 minutos.
Classificação: 14 anos.
Capacidade: 40 lugares.
Ingressos: R$30 (inteira); R$15 (meia-entrada – estudantes, idosos, PCD e seus acompanhantes); R$9 (credencial plena).