Cinco horas só pra ver Bird Clemente

Eu tinha entre 16 e 17 anos e ia para Interlagos, assistir 500 Milhas, 24 horas e outras provas daquelas épocas em que existia uma mágica romântica nas pistas. Com aquela idade, eu tinha que pedir para a minha mãe, amada dona Olinda, dar autorização junto ao Juizado de Menores.

Então, lá ia eu, rumo a Interlagos, no “busão” do Expresso Brasileiro. Naqueles tempos, não existia a Imigrantes e a subida era feita pela Anchieta, durando cerca de 2 horas. Mas, o último trecho, já em São Paulo, era terrível. Era a subida da rua Tabatinguera e ali o ônibus se “arrastava” e eu tinha a impressão de que demorava mais do que toda a Anchieta.

Bem, chegando da Praça Clóvis, E íamos (esqueci de falar que dois amigos iam comigo) para o parque D. Pedro, de onde saia o ônibus para Interlagos. Sorte quando conseguíamos ir sentados, porque a viagem urbana, naquela época, durava tanto quanto a rodoviária.

Chegando a autódromo, o desafio era pular o muro (era fácil, feito de elementos vazados) e escapar da Polícia Montada. Mas era fácil porque a distância entre o muro e uma cerca de arame farpado era pequena. Pulou, atravessou a pista e pronto, rumo aos boxes. Eu ia até o box onde ficava o meu ídolo, Bird Clemente que fazia as curvas derrapando e, como eu, usava óculos. Sim, ele pilotava de óculos sob o capacete.

Havia também o enorme desafio de enfrentar o frio, já que muitas provas aconteciam no inverno, coisa que nós, santistas, praticamente não conhecíamos. Daí, era só juntar uma galera no interno do autódromo, fazer uma fogueira para espantar o frio.

Anos depois, conheci o Bird pessoalmente e fiz questão de cumprimentá-lo e dizer a ele: você é o meu maior ídolo nas pistas. Depois dele, Nelson Piquet, Emerson, Pace e Luiz Pereira Bueno, que sempre “provocava” Bird – “não é assim que se pilota” por fazer as curvas derrapando. E os dois riam muito.

Além de derrapar nas curvas, Bird também “aprontava”. No “retão” de Interlagos (que, lamentavelmente foi colocado de lado depois da reforma), com seus 900 metros, em leve declínio havia uma grande concentração de neblina. E aí entrava a esperteza do Bird.

Como ele tinha total conhecimento da pista, sempre conseguia andar na frente em condições adversas de visibilidade. E, na reta oposta, era seguido por boa tarde dos pilotos. Quando ele percebeu isso, pediu para colocarem um interruptor no seu carro, para desligar a luz do freio. Daí, quando chegava no fim dos 900 metros, apagava a luz de freio, fazia curva que muitos não conseguiam porque não tinham sua referência.

Mais que ganhar vantagem, Bird se divertia.

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