Complicações devido à falta de peças acontecem há alguns meses em diferentes países, e vêm se agravando. Na outra ponta, segmento de usados e seminovos mantém crescimento. Carro é opção para quem quer segurança quanto ao coronavírus
Os resultados de maio foram negativos para alguns dos gigantes globais na indústria automotiva. É a crise dos semicondutores, que já ocorre há alguns meses em diferentes países, e vem se agravando, sem sinais de melhora em curto prazo. Um problema que continua influenciando no balanço do mês no mercado automotivo. “O desequilíbrio está ficando mais severo a cada dia, sem boas perspectivas para os próximos meses”, diz o diretor comercial da AutoMAIA Veículos, Flávio Maia. “São problemas graves de abastecimento da indústria automotiva que acontecem no mundo inteiro desde a virada do ano”, acrescenta.
Estes são componentes eletrônicos usados em diferentes mecanismos do carro e, com a interferência da pandemia na produção de veículos, desde o início da disseminação do coronavírus, o escopo das fábricas de semicondutores foi direcionado para o mercado doméstico (especialmente para produção de eletrodomésticos, celulares, computadores e similares). O que ocasionou uma lacuna quando as fábricas de automóveis voltaram a solicitar esses itens. Com a dificuldade em encontrar peças fundamentais para a montagem dos carros novos, os preços dispararam e os prazos de entrega foram às alturas.
“Agora, a isso também se soma a escassez de outros insumos, como espuma e plástico. E a notícia não é boa. A tendência é piorar. É uma situação crítica, e que pode continuar por anos, conforme projeções de especialistas do ramo, diferente do que se considerou no início”, vislumbra Flávio Maia, também diretor de marketing e planejamento da Associação dos Revendedores de Veículos no Estado de Minas Gerais (ASSOVEMG).
O problema, que ocorre em diversos países, chegou ao Brasil, como era de se esperar. “A Ford, a primeira a informar a revogação de alguns modelos fabricados no Brasil, agora não está mais sozinha”, lembra Flávio Maia. Por aqui, a partir desse mês, várias montadoras anunciaram o intervalo na produção. A General Motors, que congrega a marca Chevrolet, parou o trabalho na unidade de Gravataí, projetando retomada somente em julho, situação similar ao que acontece na unidade em São Caetano do Sul, cuja produção ficará suspensa até agosto, pelo menos.
A falta de peças também fere em cheio as fábricas da Volkswagen em Taubaté e São José dos Pinhais que, a partir de 7 de junho, têm a produção suspensa ao menos pelos dez dias subsequentes. Para a fábrica de São Bernardo do Campo, a Volkswagen avalia a necessidade de parada.
Neste mês, também a Nissan paralisa a fabricação dos modelos Kicks e V-Drive (antigo Versa) na fábrica de Resende, determinação válida por no mínimo cinco dias, definidos ao longo do mês de junho. E isso é o que se tem até o momento. “Certamente, outras montadoras ainda vão amargar os efeitos da escassez global dos semicondutores”, avalia o diretor da AutoMAIA.
Nos Estados Unidos, entre grandes grupos automotivos, o fechamento de maio aconteceu com menos 850 mil veículos produzidos. No México, o quadro mais crítico é enfrentado pela Volkswagen, que informou a paralisação da fábrica em Puebla por três semanas pela falta de semicondutores. Na mesma situação, está a fábrica da Stellantis em Toluca, que terá sua linha de montagem parada por duas semanas.
Na América do Norte, os fabricantes mais afetados foram, nessa ordem: Ford, General Motors, Stellantis, Subaru, Volkswagen, Honda, Nissan, Toyota, Tesla e Mazda. No continente como um todo, as montadoras estimam perda de 1 milhão de veículos, nos registros até o fim de maio.
Na Europa o cenário se repete. A Audi estabeleceu regime de meio período de jornada para 10 mil funcionários, diante da escassez de componentes eletrônicos para seguir com o ritmo satisfatório nas fábricas. A montadora se junta à Ford, que no continente europeu interrompeu os trabalhos em três países.
No Japão, entre as montadoras que interromperam parte da produção estão Toyota, Honda, Nissan, Mitsubishi e Suzuki, com um impacto estimado na produção de mais de 500 mil veículos. Na Argentina, as vendas em junho também devem ser afetadas.
Como se observa pelo mundo inteiro, a dificuldade em obter os chips está forçando empresas do ramo a suspender por algum tempo a produção em algumas fábricas, outras elaboram novas formas de organizar as linhas de montagem, voltando o foco da produção para modelos mais lucrativos, a fim de evitar a interrupção das atividades. Uma das alternativas encontradas é também desviar os componentes de um tipo de carro para outro, até mesmo deixando de fabricar itens de série e diminuindo os aparatos tecnológicos, com prioridade para carros mais populares e de maior liquidez.
As lacunas no suprimento de componentes para a fabricação de carros novos e o encurtamento da demanda no mercado interno, ao lado das medidas restritivas quanto ao coronavírus, estão mesmo entre os motivos que causam apreensão no setor.
Com o início desse movimento de paralisação entre as montadoras no Brasil, em março desse ano a Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) já havia constatado a parada de Mercedes, Renault, Scania, Toyota, Volkswagen, Volkswagen Caminhões e Ônibus, BMW, Agrale, Honda, Jaguar, Nissan, GM e Volvo. A perspectiva entre as montadoras, até então, era de começar a voltar em abril, até o final de maio – e, em muitos casos, isso não aconteceu.
Entre concessionárias e revendedores, quem trabalha com compra e venda de carros depende dos rumos da pandemia para entender melhor o que vem pela frente e se preparar para tanto. Em 2021, a expectativa é que até 300 mil veículos podem não ser fabricados no Brasil. “Ainda vamos enfrentar por um tempo o que estamos perdendo agora”, diz Flávio Maia, pontuando que o problema também afeta o cenário do emprego e da economia como um todo, em última análise, com reflexo direto no PIB.
A COVID-19 impulsiona a aplicação de novas ferramentas para fazer frente a uma situação que, de simples, não tem nada. Chegar ao consumidor nesse momento em particular é, na verdade, um grande desafio. Hábitos e comportamentos mudaram. E empresas que conseguem se adaptar bem e fortalecer abordagens por plataformas digitais saem na dianteira.
As vendas não pararam, mesmo quando as portas do comércio ainda estavam fechadas. Os suportes virtuais são uma alternativa para amenizar dificuldades. “Na AutoMAIA Veículos, 68% das vendas de 2021 vieram dessas ferramentas. O Instagram do grupo recebe entre 700 mil e 800 mil visitas todos os meses”, diz Flávio Maia.
Enquanto a produção de carros zero quilômetro enfrenta tantos desafios, o resultado de maio para o segmento de seminovos e usados é positivo, confirmando o movimento de alta que acontece nos últimos meses. Fato é que as pessoas continuam optando por ter um carro próprio, até mesmo uma medida de segurança e precaução quanto ao coronavírus. “Ter um carro significa não precisar de transporte coletivo, evitando o contato com outras pessoas”, compara Flávio Maia.
Segundo relatório da Fenauto, entidade que representa lojistas multimarcas do setor, em Minas Gerais, o número de vendas de carros seminovos e usados em maio de 2021 foi de 166.987 unidades, aumento de 17,4% na comparação com abril, quando foram registradas 142.181 unidades vendidas, e crescimento de 90,4% no paralelo com maio de 2020, quando foram computadas 87.684 unidades vendidas. Considerando o acumulado do ano em Minas Gerais, até o fim de maio foram 753.084 carros usados e seminovos comercializados, frente a 491.368 no acumulado de 2020, no período equivalente, incremento de 53,3%.
No Brasil, conforme a Fenauto, as vendas de veículos seminovos e usados em maio, em comparação com abril deste ano, tiveram alta de 18,5%, registrando 1.325.336 unidades comercializadas, contra 1.118.285. No paralelo com maio de 2020, o balanço também ficou positivo em 198,1%. No acumulado do ano, houve crescimento de 59,2%, o que reflete um bom desempenho do segmento, já melhor preparado para enfrentar as circunstâncias adversas.
Para o presidente da Fenauto, Ilídio dos Santos, esse cenário “aponta um bom momento do setor que deve continuar nas próximas semanas, caso não aconteça nenhum retrocesso em função do agravamento da pandemia”
Em Belo Horizonte, ainda assim, existe receio entre os empresários justamente sobre a possibilidade de agravamento da pandemia, que poderia novamente refletir nas atividades econômicas na cidade.
“Estamos nos preparando para uma possível terceira onda, tomando dentro da loja todas as medidas de segurança e prevenção quanto ao coronavírus. Neste cenário de incertezas, o volume de negócios no ramo dependerá muito dos resultados das ações de contenção à Covid-19 e da evolução da imunização”, constata Flávio Maia.