A galáxia em boas mãos
Mais uma vez o Brasil estréia um filme antes dos EUA, mais uma vez a Marvel transforma em realidade a fantasia dos quadrinhos
De algum tempo para cá, finalmente os quadrinhos conseguiram chegar às telas com a mesma qualidade e impacto que tinham nas revistas que líamos na nossa infância e adolescência. O nome do sujeito que faz essa mágica, que conseguiu transformar em realidade o que as loucas cabeças dos artistas e editores imaginavam, se chama computador. As centenas de horas de “renderização (ou simplesmente render)” são as grandes responsáveis hoje pela realidade virtual que assistimos maravilhados no cinema.
Estréia hoje nos cinemas brasileiros e amanhã nos americanos, Guardiões da Galáxia (Marvel Studios, Walt Disney Studios Motion Pictures), uma obra prima no uso do computador e sua capacidade em digitalizar ações e emoções em cenários absolutamente virtuais. Cerca de 60% do filme foi rodado em fundo de Chroma Key, os atores quase sempre pendurados em cordas e as câmeras interagindo com elementos humanos sem referencias ambientais.
Foram poucos os cenários físicos e externas em lugares reais, tudo é, na verdade, criado nas telas dos monitores das estações de trabalho. É feito com uma técnica espetacular, envolve diversos setores do cinema em sua capacidade máxima, extraindo sempre um resultado pra lá de excelente.
O futuro tem pitadas dos anos 80, época em que o diretor e roteirista James Gunn provavelmente se encontrou como gente e adorava a trilha sonora que embalava essa época de desbunde dos habitantes da terra, principalmente os americanos. A obra que ele nos oferece é da melhor qualidade, amarrado em um roteiro dinâmico, ágil e ao mesmo tempo simples, ficando a execução como o grande desafio.
A estória, que começa nos anos 80, é uma aventura espacial com muita ação, onde o impetuoso aventureiro Peter Quill (numa interpretação muito convincente e divertida de Chris Pratt, mais próximo do seu personagem em De Repente Pai, do que do soldado de A Hora Mais Escura), se vê como objeto de uma caçada implacável após roubar uma misteriosa esfera cobiçada por Ronan, (como sempre o vilão é o ator mais experiente, e Lee Pace que já fez Lincoln, A Saga Crepúsculo – Amanhecer, as duas seqüências de O Hobbit, incorpora ferozmente o personagem, mas exagera um pouco nas caras e bocas) um vilão poderoso com ambição que ameaça todo o universo. Para fugir do determinado Ronan, Quill é forçado a fazer uma complicada aliança com um quarteto de desajustados – Rocket, um guaxinim atirador (totalmente virtual, mas que empresta a voz de Bradley Cooper, que arrebentou em O Lado Bom da Vida e Trapaça), Groot, uma árvore mutante humanóide (também virtual e que é, digamos, dublado em sua interpretação monossilábica pelo fortão Vin Diesel, que fez toda a série Velozes e Furiosos), a mortal e enigmática Gamora (onde a exótica Zoe Saldaña, que já viveu Anamaria em Piratas do Caribe: A Maldição do Pérola Negra e a implacável Cataleya Restrepo em Em Busca de Vingança) e o vingador Drax, o Destruidor (aqui vivido pelo ex-lutador de WWE, um tipo de luta livre, Dave Bautista, mas que no cinema teve algumas incursões em papeis de fortões briguentos). Quando Quill descobre o verdadeiro poder da esfera e o perigo que ela representa para o cosmo, ele deve fazer seu melhor para reunir seu grupo desorganizado para uma última e desesperada resistência, com o destino da galáxia em jogo.
É uma produção de mão cheia, difícil, cheia de detalhes, e que deve ter custado horas de mais horas de planejamento, até porque as filmagens começaram em junho do ano passado e seguiram até o outono europeu. Na verdade foi um tempo recorde entre as filmagens e finalização, se levarmos em conta que, outros filmes com a mesma complexidade demoram muito mais tempo para ficarem prontos e serem exibidos. Do início das filmagens até a estréia, foi pouco mais de 1 ano!
Essa agilidade também se deu graças ao grande número de atores e personagens com maquiagens próprias e adereços feitos em seus próprios corpos. A captação quase pronta facilita na hora de se montar. Para se ter uma idéia, ao longo do processo de filmagem, o departamento de efeitos especiais de maquiagem fez aproximadamente 1.250 aplicações de maquiagem protética. Havia 50 artistas de maquiagem no total, trabalhando em equipes em cada um dos personagens.
Eram muitos figurantes, que exigiram a confecção de dois mil moldes de alienígenas humanóides. A desenhista de maquiagem e cabeleireira Elizabeth Yianni-Georgiou (que já fez filmes como Thor: O Mundo Sombrio, O Legado Bourne, A Rede Social), teve muito trabalho para desenvolver os diferentes alienígenas, cujas peças eram pré-coloridas de acordo com cada raça.
O caso mais espetacular é o personagem Drax, o Destruidor. As tatuagens e cicatrizes que cobrem todo o seu corpo levaram a um processo de maquiagem protética que fez Bautista encarar sessões diárias de 4 horas de pé, pois ele não podia se sentar durante a aplicação. Eram cinco maquiadores para aplicar todas as peças, que consistiam de 18 para o corpo e rosto.
Tudo isso amarrado em um roteiro muito bem feito pelo próprio diretor e Nicole Perlman, que mistura ação, emoção e diversão, cara das produções Marvel. O diretor de fotografia é Ben Davis (Fúria de Titãs), um inglês que prima pelas siluetas mais recortadas dos personagens, deixando quase sempre os cenários e fundos como meros coadjuvantes nas cenas.
É um estilo bem típico de filmes dos anos 80, onde os orçamentos brigavam com as disponibilidades técnicas e se economizava em iluminação, mas trás para esse momento uma forma interessante de se mostrar o desenrolar do enredo.
Como editor que fui, sei do perrengue que o Fred Raskin (Velozes e Furiosos 5, Django Livre) e o Hughes Winborne (A Procura da Felicidade e o espetacular Histórias Cruzadas) tiveram para juntar todo esse quebra-cabeça cinematográfico, tamanha a complexidade e a quantidade de takes envolvidos. A montagem surpreende, é direta, clara, ritmada e tem as medidas exatas dos tempos de ação e reação. Em nenhum momento o filme cansa, ao contrário, a cada cena, a cada corte, ficamos esperando o que será apresentado a seguir.
Não perca tempo, marque sua poltrona, opte por assistir em 3D e se segure na cadeira e não saia antes do fim dos créditos. Guardiões da Galáxia não é apenas um filme de ficção cientifica retirado dos quadrinhos, é uma espetacular realização e que dever arrebentar bilheterias, é a mágica do cinema que faz você pedir mais um!
Texto: Eduardo Abbas
Fotos: Studio Disney/Divulgação